O
estudo da estrutura do bambu (morfologia) nos
dá conhecimento para desenvolver conscientemente e melhor o plantio do mesmo. Segundo o livro "Bamboos", de Christine Recht
e Max F. Wetterwald (Timber Press - Portland,
Oregon), o bambu é uma planta que não perde as
folhas no outono e desenvolve novas folhas na primavera. Elas são
substituídas imediatamente por novas folhas no começo da primavera. A forma de
reprodução desta planta através de sementes é
geralmente um evento muito demorado e o homem costuma usar métodos de propagação vegetativa.
O
bambu é uma planta muito resistente, podendo
se recuperar de um ano ou uma estação ruim.
Após a destruição de Hiroshima pelas armas
atômicas os bambus resistiram, e foram as primeiras plantas a aparecer no árido
cenário pós-guerra.
Continuando a citar o livro de
Recht e Wetterwald:
"a estrutura do bambu consiste no sistema subterrâneo de rizomas, os colmos e os galhos. Todas estas partes são formadas do mesmo princípio; uma série alternada de nós e entrenós. Com o crescimento do bambu, cada novo internó é envolvido por uma folha caulinar protetora, fixada ao nó anterior no anel caulinar. Os nós são massivos pedaços de tecido, compreendendo o anel nodular, o anel da bainha e geralmente uma gema dormente. Estas gemas são o local de emergência do novo crescimento segmentado (rizoma,colmo ou galho).
RIZOMAS
Os rizomas são caules subterrâneos que crescem, reproduzem-se e afastam-se do bambu, permitindo a colonização de novo território. A cada ano novos colmos (brotos) crescem dos rizomas para formar as partes aéreas da planta. Rizomas de 3 anos ou mais não dão mais brotos. Esses rizomas estão geralmente tão compactados que o solo abaixo do bambu aparenta estar cheio deles. Eles formam um tufo similar às gramas ordinárias, e podem variar em profundidade, dependendo da espécie e condições de crescimento, contudo muitas vezes abaixo de um metro."
Os
rizomas reproduzem-se dos rizomas e permanecem
conectados entre si. Nesta interconexão, todos
os indivíduos de um mesmo grupo são descendentes (clones)
do rizoma primordial, e são, até um certo ponto, interdependentes e solidários. Os brotos utilizam as reservas de um grupo para crescerem
e brotarem. Os bambus do centro do grupo são
os mais velhos, e os da orla os mais
jovens. Uma forma generalizada de identificar o bambu maduro é observar a ocorrência de manchas e sujeiras, além de sua rigidez. Os bambus jovens serão mais
brilhantes, podendo ainda estar envoltos pelas folhas
caulinares, e mais flexíveis e
húmidos internamente. Os bambus velhos estão
podres ou secos.
As
pontas dos rizomas são o ponto de crescimento,
e elas são envoltas por folhas caulinares muito apertadas, que morrem
rapidamente para dar lugar ao entrenó crescido, e assim por diante. As verdadeiras raízes do bambu crescem dos anéis dos
rizomas, senda mais finas que estes e captando água e
nutrientes do solo ao redor.
Segundo o americano Tydyn Rain St. Clair, citando McClure, os bambus podem ser divididos basicamente em
seis tipos diferentes de rizomas, sendo os
dois primeiros seguintes os principais:
PAQUIMORFOS
(clumper / cespiteux)
são os rizomas com formas de bulbo, tendo os entrenós muito curtos e compactos. A ponta está geralmente orientada para cima, e dela sai o colmo do bambu, mais fino que o bulbo. As gemas encontradas nos nós do rizoma são de onde saem novos rizomas. A cada ano pode ser produzido um novo rizoma do original. O crescimento deste tipo de bambu é em touceiras ou 'tufos', onde não se consegue caminhar normalmente por dentro deles. Eles crescem lateral e radialmente, afastando-se muito pouco uns dos outros. Podem ter pescoços curtos, médios ou longos.
São
encontrados, em geral , nas espécies tropicais, como as do gênero Bambusa e Guadua, porém podem ser encontrados também em
espécies temperadas.
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estrutura
subterrânea do bambu de rizoma paquimorfo de pescoço
curto
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distribuição
radial e genealógica
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touceira /
moita de bambus paquimorfos
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Na
Ásia temos os exemplos vivos mais antigos da
arquitetura com bambu, em templos japoneses, chineses e indianos. O Taj Mahal teve sua abóboda estruturada por metal
recentemente, quando substituíram a estrutura milenar de bambu. A construção de
pontes de bambu na China é algo espetacular,
com vãos enormes e tensionadas com cordas de bambu. Na África também encontram-se muitas habitações populares
construídas com bambu.
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LEPTOMORFOS (runner / traçant)
são os rizomas elongados e finos, tendo os entrenós longos e espaçados. A ponta está geralmente orientada horizontalmente, e ela é muito dura e conquista espaço. As gemas encontradas nos nós do rizoma são de onde saem novos rizomas e colmos (brotos). Os colmos são mais grossos que o rizoma. Algumas vezes a ponta do rizoma pode seguir para cima e se tornar um colmo novo, mas é mais comum o aparecimento de colmos nos lados do rizoma, alternados entre esquerdo e direito. O crescimento deste tipo de bambu é em florestas, onde se consegue caminhar normalmente por dentro deles. Eles crescem lateral e radialmente, afastando-se linearmente uns dos outros. São bambus de hábitos invasivos.
São
encontrados, em geral, nas espécies de clima temperado, como as do gênero
Phyllostachys.
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estrutura
subterrânea do bambu de rizoma
leptomorfo
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distribuição
radial e genealógica
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bosque /
floresta de bambus leptomorfos
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ANFIMORFOS
possuem rizomas paquimorfos e leptomorfos no mesmo sistema (esta versão é de McClure, diferente da versão de Keng). Ex: Chusquea fendleri
LEPTOMORFOS com colmos
agrupados
possuem rizomas leptomorfos, porém alguns deles congestionam-se, formando grupos que superficialmente lembram os originários de rizomas paquimorfos. Contudo este bambu não é anfimorfo pois não possue verdadeiros rizomas paquimorfos, todos sendo ocos e da mesma grossura dos colmos. McClure chamou este fenômeno de eixo de metamorfose 1. Existem espécies com rizomas deste tipo nos gêneros Pleioblastus, Pseudosasa, Indocalamus e Sasa, entre outros.
PAQUIMORFOS de pescoço longo
com colmos agrupados
possuem rizomas paquimorfos de pescoço longo, e são análogos ao sistema anterior. Superficialmente aparentam ser anfimorfos, porém não possuem rizomas leptomorfos. Este tipo de rizoma é característico do gênero Yushania.
PAQUIMORFOS
de pescoço muito longos com rizomas ao longo
do pescoço
possuem rizomas paquimorfos normais com pescoços muito longos, e destes originam-se novos rizomas paquimorfos em grupos. McClure chamou este fenômeno de eixo de metamorfose 2. Característico do gênero Vietnamosasa.
Mr.
Tydyn sugere que leiamos o trabalho de McClure, "Bamboos - a fresh
perspective", para obter maiores explicações do
autor.
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Tipos
de rizoma
Paquimorfo
1 - pescoço curto 2 - pescoço médio 3 - pescoço longo
4 -
Leptomorfo
5 -
Anfimorfo
6 -
Paquimorfo c/ colmos reptantes
7 -
Leptomorfo c/ colmos reptantes
8 -
Paquimorfo de pesc. longo com rizomas no
pescoço
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ilustração baseada em desenho do
livro de F.A.McClure "Bamboos - A fresh
perspective"
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COLMOS
Os
colmos são a parte que mais facilmente
distingue uma espécie de outra, por terem tamanhos, diâmetros, cores e texturas
diferenciadas. São na maioria ocos, mas
existem exceções. Os entrenós do gênero Chusquea, das Américas Central e do Sul, são sólidos, assim como a espécie Dendrocalamus Strictus. Algumas espécies possuem
água no interior dos entrenós. Existe uma
espécie cujos colmos tem forma naturalmente quadrangular, com cantos
arredondados, o Chimonobambusa quadrangularis.
Pode-se induzir uma forma ao colmo,
construindo uma estrutura contenedora ao redor do broto até uma altura de cerca
de um metro e meio. O broto mole se adapta ao formato da
caixa e seus colmos telescópicos também. A partir daí o bambu cresce
com o formato induzido, triangular, quadrado, etc...
Os
colmos de bambu consistem em fibras que chegam
a centímetros, feitas de lignina e silício. Segundo Mr. Stanford Lynx "a parede das
células do bambu é um composto feito de um rígido polímero de celulose em uma matriz de lignina e as
hemiceluloses." O silício agrega resistência
mecânica ao bambu. A matriz de lignina dá flexibilidade.
O
broto que cresce de um rizoma é um colmo ainda "recolhido" e totalmente protegido pelas folhas
caulinares. O colmo como broto lembra um telescópio recolhido, e, conforme cresce, suas partes
internas se afastam umas das outras, como um telescópio aberto. Na sua fase
inicial de crescimento observam-se as maiores
velocidades de crescimento do reino vegetal, com algumas espécies
gigantes crescendo até 40 cm em 24 horas. No
final do primeiro ano o bambu já completou seu crescimento. As folhas caulinares protegem os entrenós até a parte
essencial do crescimento ter se completado, então secam e caem.
As
folhas caulinares consistem principalmente na bainha e na lâmina
(ou limbo), e também na lígula com suas
franjas, e duas aurículas com suas cerdas. Estas especificidades ajudam na identificação de uma espécie. As folhas caulinares dos
nós mais superiores possuem lâminas mais longas que as inferiores.
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foto
microscópica
de corte transversal / fibras de bambu Dr. Grosser / Munique - 1000 Things of Bamboo |
composição da
folha caulinar: note que a lâmina,
a lígula e a franja podem ser curtos ou longos, ajudando na identificação das espécies |
GALHOS
Os
galhos se desenvolvem a partir das gemas existentes nos nós dos colmos. No
gênero Phyllostachys os galhos se desenvolvem ainda na fase de broto, provocando
uma ranhura alternada no colmo, por crescerem forçando espaço. Nos gêneros
Phyllostachys e Semiarundinaria os galhos se formam ainda nos brotos, e aparecem
conforme o colmo se alonga, porém nos outros gêneros os galhos só aparecem após
o colmo ter completado seu ciclo de elongamento. Os galhos podem começar a se
desenvolver do tôpo para baixo, ou vice-versa, dependendo da espécie. Quando há
falta de luz, os galhos inferiores podem não se desenvolver
propriamente.
Existe um número habitual de galhos
em uma dada espécie, o que contribui para facilitar a
identificação.
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colmo e
galhos
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FOLHAS
As
folhas não crescem diretamente de uma gema dos galhos. Elas
são, na verdade, lâminas de folhas caulinares que crescem em galhos. Estas lâminas
tornam-se bem mais elongadas que nas folhas
caulinares dos colmos, tomando a forma e a função, fotossintética, de uma folha. Nos galhos estas
folhas-lâmina estão conectadas à bainha por uma projeção de sua veia principal, em forma de uma curta haste. Quando a folha seca, começando pela ponta, esta
haste quebra, e a bainha permanece conectada por mais tempo ao galho. Uma folha
de bambu sobrevive até cerca de dois
anos.
Por
terem um padrão de veias que se espalham em ângulos retos e paralelos (em inglês
"tesselation"), as folhas ganham resistência
ao frio.
FLORAÇÃO
O
bambu não possue um ciclo anual de floração.
Na verdade, a floração do bambu ainda é um mistério para os botânicos. Podem ocorrer em longos
períodos de 10, 50 ou até 100 anos. A
identificação das espécies é feita através da coleta de flores, o plantio
de sementes e a observação dos resultados. É por essa razão que a identificação exata
das espécies de bambu é tão complicada. Uma
geração inteira pode passar sem que um determinado bambu tenha
florescido.
A
floração de um bambu é um evento não apenas
misterioso, mas muitas vezes fatal para o próprio bambu. Este fato decorre do desvio de toda
a atenção e esforço da planta para o florescimento, retirando as reservas
contidas nos rizomas. A planta pára de produzir
folhas, e pode vir a desgastar-se até a morte. Existem casos de um grupo inteiro perecer ao
mesmo tempo. Sementes podem ser recolhidas,
mas atualmente ainda não há um procedimento seguro para plantio de sementes de bambu. A
diferenciação entre as espécies, as variedades
cultivadas, não são garantidas através das sementes. A semente de uma
espécie variegada (com estrias) não garante a continuação da variegação nos seus
brotos. O bambu pode chegar a ter uma reprodução anemófila (causada pelo
vento), e naturalmente reaparecer no mesmo local de sua morte.
Porém
nem todo bambu que floresce morre. Ximena
Londoño afirma que o gênero Guadua
costuma ter sempre um indivíduo florescendo em um dado grupo. Existem relatos de
floração contínua durante meses ou anos.
Atitudes podem ser tomadas para interromper a
floração de um grupo ou indivíduo, porém os relatos e os resultados ainda são
inconclusivos. Alguns cortam os culmos florescentes, outros retiram o rizoma
inteiro.
A
ocorrência simultânea de florações de uma
mesma espécie em diferentes locais do mundo é um evento ainda estudado. A teoria
mais aceita é que as plantas de um mesmo clone
(reproduzidas através de pedaços de uma mesma planta) podem florescer
simultaneamente em locais diferentes. Especialistas discutem hoje em dia o
equilíbrio entre as influências genética e
climática na causa do florescimento. Afirmam que um stress ambiental ou induzido artificialmente podem
causar uma floração em bambu.
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florescência
de Bambusa tuldoides
Rio nov. 2000 |
semente de
bambu - Pseudosasa japonica
Chester Hill |
ESTAÇÕES
O
comportamento do bambu obedece as estações,
como todas as plantas. Seu ciclo é lógico, e
deve ser utilizado para o planejamento de plantações e colheitas, de acordo com
a finalidade que se quer atingir. No verão e
no outono os colmos adultos estão recolhendo
energia do sol e armazenando nos rizomas.
Quando chega o inverno a planta chega a um
estado de baixo metabolismo, como uma
"hibernação". Chegando a primavera o alimento armazenado é utilizado na
produção dos novos brotos e rizomas. E no fim
do verão pode-se recolher os novos brotos para alimentação. De uma forma geral
podemos dizer que a energia (seiva) está armazenada nas raízes no inverno. E no
verão está espalhada pelos colmos. O verão é a pior
época para colher colmos, eles serão certamente menos resistentes ao
ataque de fungos e bactérias. No inverno os colmos estão mais secos, portanto
menos aptos a serem atacados por pestes. No
fim do verão os bambus procuram estender seus rizomas e começar a guardar seus
nutrientes.
FERTILIZANTES
O
bambu é uma planta faminta e sedenta. Ele
costuma exaurir os solos de seus nutrientes preferidos. Consome basicamente
muito nitrogênio na primavera e no verão,
enquanto no outono consome mais Fósforo e
Potássio. Podem-se utilizar fertilizantes que se adequem a esta
dieta, tanto químicos quanto orgânicos. A grama é uma ótima fonte de nitrogênio e silício.
Lascas de árvores também. O esterco, apesar de ser um ótimo nutriente, pode trazer
ervas competitivas. Em uma plantação nova deve-se tomar cuidado com as ervas
competitivas que roubarão os nutrientes do bambu.
A
época depois do aparecimento de brotos é uma boa época para se fertilizar, assim como no final do verão. Porém
melhores resultados são obtidos fertilizando em pequenas quantidades
continuamente durante o ano, excetuando o inverno. No inverno pode-se cobrir a
terra em volta dos bambus com uma camada de composto orgânico para isolar os
rizomas de um frio excessivo. As próprias folhas caídas do bambu servem como
estabilizador da humidade e da temperatura no solo, assim como ajuda a reciclar
o silício.
Uma
plantação nova de bambu deve receber bastante água, pois corre o risco de secar rapidamente e morrer.
Porém deve ter-se também o cuidado de não regar
demais, o que pode ser tão danoso quanto a seca. Plantar os bambus
perto de uma fonte de água corrente é uma boa estratégia, já que o solo estará
continuamente úmido.
SOLO
O
bambu pode crescer em solos de diferentes graus de arenosidade, acidez, humidade
e temperatura. Porém ele se dá melhor em solos levemente
ácidos e argilosos, com 5.5 a 6.5 de
pH.
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